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quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Que pasa?

É impressionante o quanto certas produções audiovisuais estadunidenses cuidam tão bem de alguns aspectos de produção e deixam a desejar em outros. Não que eu seja um cata-piolho, mas tais desleixos, às vezes, são berrantes. Quando a história se passa no Brasil, então...é como se meu radar para erros fosse acionado automaticamente, e daí eu fico chato: olho roupas, nomes, lugares, trejeitos, e chego a aumentar o volume pra ouvir se a galera fala direito.

Parto do seguinte princípio: se há uma produção decente (leia-se “com grana”), com cenas filmadas aqui pra valer (muitas vezes usam o chroma, estúdio ou locações fechadas para simularem que estão em outros países), então o que tem de mal em se esforçarem para que pareçam estar no Brasil de verdade, certo?

Minha última experiência foi na noite passada, com um episódio da série The Unit (que aqui ganhou o subtítulo forçado de “Tropa de Elite”), a qual tenho acompanhado nas minhas madrugadas de insônia. Trata-se de um seriado de ação no qual os Estados Unidos criam uma espécie de força-tarefa ultra secreta que só responde ao presidente americano e realizam intervenções pelo mundo todo, normalmente sem conhecimento de nenhuma autoridade estrangeira. Em contrapartida, as esposas desses soldados de elite tentam proteger os segredos da Unidade e aguentar as pontas em casa, sem saber ao certo se seus maridos voltarão das missões inteiros ou aos pedaços.

Eis que no episódio Eating the Young (S.01-E.09), nossos heróis são enviados ao Rio de Janeiro para deter um negociante de armas e apreender 7 mísseis Stinger que estão em seu poder e que seriam vendidos para serem usados por terroristas nos Estados Unidos. Quando apareceu a favela ao fundo, pulei da cama e comecei a anotar mentalmente a sucessão de erros:

- Jonas e Charlie (“disfarçados” de turistas) desfilam batendo fotos indiscriminadamente com máquinas fotográficas enormes (?), às portas da favela;

- Uma guarnição policial aparece em um jipe (??). Não consegui ver a placa;

- Os tais policiais entram calmamente em um barraco. Escuta-se som de tiros. Eles saem arrastando dois corpos e retiram do barraco várias sacas de arroz cujos selos acusavam que haviam sido doadas pelo Governo dos Estados Unidos (???). Charlie cochicha para Jonas: “Terra de Ninguém”;

- Alguns piás estão jogando futebol e um deles chuta a bola no braço de um dos policiais. A mãe do garoto pede piedade num portunhol brabo: ela tira moedas (????) do bolso e oferece ao oficial. Ele dá um tiro na bola e manda ela sumir logo dali (por incrível que pareça, num português decente);

Essa merda toda acontece logo nos primeiros cinco minutos, e havia ainda 40 de episódio.

Admito que as piores coisas vieram no início, mas se o roteirista (que definitivamente não fez o seu dever de casa, e nem acessou o Google pra escrever essa bosta) estava dando um tempo, a produção não deixou a peteca cair: todos os pirralhos usavam All Star (?????), o negociante de armas se chamava “Jimenez” e quase todo o elenco era adepto do portunhol. Vale salientar aqui o personagem principal deste episódio: um menino, vestido com a camisa da seleção brasileira, que leva os americanos até um avião abatido e FALA INGLÊS FLUENTE. Quando perguntado aonde aprendeu o idioma, ele diz que sua mãe era empregada doméstica na casa de um gringo. Só que o guri não conseguiu inventar uma boa desculpa para o seu péssimo português.

Enquanto procurava uma imagem para ilustrar esta “divagação”, encontrei um pequeno texto no blog Diário de um PM, escrito por um policial militar de verdade do Rio de Janeiro. O texto tem link para a cena acima citada, bem como algumas opiniões de outros PMs sobre a mesma. Se quiser conferir, basta clicar aqui. Vale a pena.

Criada por David Mamet, um dos roteiristas e diretores mais bem conceituados de Hollywood, The Unit até que é um bom seriado. Bons enredos, boas direções e atuações. Dennis Haysbert (o presidente David Palmer de 24) esbanja carisma e comanda um bom time, ao lado de Robert Patrick, o eterno T-1000, no papel do Coronel Tom Ryan. A série (que está hoje em sua quarta temporada) foi baseada no livro Inside Delta Force, escrito pelo Sargento Major Comandante Eric. L. Haney, um militar aposentado que participou de trocentas missões de resgate e operações de risco (incluindo Beirute, Honduras, Granada e Irã), e foi condecorado uma pá de vezes. Desde sua criação em 2006, a série vem ganhando respaldo da crítica e já garantiu uma quinta temporada.

Com esses atributos, espero mesmo que The Unit venha, nos próximos episódios, a respeitar um pouco mais a minha inteligência em suas caracterizações (executando produtores deste tipo, quem sabe). Quanto às produções gringas no geral, acho que esperar tal coisa seria meio inutil, uma vez que o hábito de colocar brasileiros na tela falando espanhol e cismar que há uma cidade de ouro perdida na Amazônia está incutido no American Way de fazer cinema.

Anaconda que o diga...