...depois de uma dolorosa sessão de detetização, os oficiais da lei nos dão cobertores, chá e biscoitos. O Basi se atraca e eu fico feliz de ver onde são gastos os impostos e mais feliz ainda de ser um sonegador. Quando verificam nossas identidades, a hospitalidade acaba. O Basi com ficha suja por pequenos furtos e eu com pena de morte por trafico de cerveja. Os cinco tripulantes se afastam como se eu fosse radiativo.
Talvez eu seja. Um turbilhão de lembranças me passam pela cabeça. Uma época em que isso tudo era uma loucura de algum filme de cinema fantástico. Onde beber uma cerveja era algo tranquilo e arrancar o olho de uma garçonete era uma desgraça. Mas tudo mudou. Flashs me atingem como agulhas luminosas nos recantos da mente. Fazia tempo que eu não tinha dessas dores de cabeça. Como se o inferno todo resolvesse arder no meu crânio.
06 de Maio de 2010. Pessoas caindo. Uma peste bíblica fazendo todo mundo no planeta perder alguém. Os jornais falavam em tempestade solar. As bocas pequenas falavam em lúpulo e cevada contaminados. No momento não importou muito, pois a chamada Gripe de 2010 chegou por terra, ar e mar e abateu como gado quase 2/3 da população mundial.
12 de Junho de 2010. Entra em vigor a Lei Allan Winston. Embora o restante da população fosse imune ao vírus pelo ar, as autoridades adotaram medidas absurdas para conter a ameaça. Execuções. Cerceamentos. Execuções de novo. Quarentenas. Execuções mais uma vez. Nem preciso dizer o quanto as coisas ficaram complicadas depois disso. Se o Governo Americano já não era exatamente querido, desta vez era odiado. Estragou o Dia dos Namorados de todo mundo.
23 de Setembro de 2010. Instituída a Lei Seca para Cervejas e Outros Fermentados. Precisavam de um bode expiatório, e como tempestades solares ainda não podem ser contidas, se contentaram em penalizar qualquer coisa que contivesse lúpulo e cevada. Acho que teve gente que chorou por sete dias e sete noites. Eu fui um.
02 de Novembro de 2010. Data do primeiro atentado à bomba no Centro de Resistência de Frankfurt. Toda esta pressão acabou por despertar a insanidade dos sobreviventes, que transformaram suas fantasias e perversões em realidade. Uma série de atentados no mundo todo teve início. Virou baderna. Roubos. Saques. Assassinatos. Tudo em massa. Com tanta coisa para consertar e corpos para enterrar, os mantenedores da lei acabaram por tentar impedir os elefantes e deixar as formigas passarem. Constituições foram reescritas. Leis especiais foram criadas. Não havia contingente para impedir pequenos roubos ou agressões. Se concentravam nos crimes exponenciais. Genocídios, destruição em larga escala ou qualquer coisa que pudesse dar margem para isso. Admito que essa vista grossa já me salvou de algumas enrascadas. Digamos que nunca fui um elemento fácil. Acho que ninguém mais foi, depois de 2010.
É. Aquele foi realmente um ano de merda.
Quando minha dor de cabeça me dá um desconto e meus lábios páram de tremer, pergunto se há um Juiz de Rua entre eles. Um piá que não deve ter mais de vinte anos se manifesta. Dei sorte de pegar um novato. Sempre colocam os recém formados nos piores locais de trabalho. Neste caso, o meteram numa equipe de ronda permanente no Rio Guaíba. Não consigo pensar em nada mais deprimente que isso para um Juiz. Ele se aproxima devagar e me pergunta o que quero. Pelo menos tem colhões. Eu não quero nada. Seguro o Basi pelo colarinho molhado e faço os biscoitos voarem com três tapas no rosto do infeliz.
- O Basi aqui tem uma confissão a fazer.
O Juiz mal ouve a palavra “confissão” e já coloca o detector de mentiras no Basi. Ao contrário de sua fama de “língua frouxa”, o Basi silencia. Quebro o braço dele e tudo se ilumina. Ele fala tudo que pode. Põe em pratos limpos. Explica que deu o testemunho para a PN para se livrar de uma dívida de jogo que tinha comigo. Que forjou os fardos de cerveja com latas falsas. E que não fazia a menor idéia de que tráfico de fermentados dava execução. O display do detector dá sinal verde para tudo.
- Era só uma sacanagem. – Diz o Basi, segurando o braço mole.
Arranco os dentes do Basi num murro e ajeito meu casaco encharcado. Por causa desse imbecil, quase viro comida de cachorro. Algemam o Basi e me pedem desculpas pelo comportamento. Não vou guardar rancor por quase terem borrado as calças achando que eu era um terrorista. Só lamento não ter uma câmera pra filmar isso e ganhar uma fortuna no YouTube.
O hovercraft me deixa no cais. O Basi ficou com eles para “dar explicações do seu ato imponderado”. Que fanfarrão esse Juiz. Quase sinto pena do pobre Basi. Acho que vai pegar uns anos de cana ou duas sessões de videotortura. Mas podia ser pior.
Ele podia estar com uma bomba no pescoço...
Talvez eu seja. Um turbilhão de lembranças me passam pela cabeça. Uma época em que isso tudo era uma loucura de algum filme de cinema fantástico. Onde beber uma cerveja era algo tranquilo e arrancar o olho de uma garçonete era uma desgraça. Mas tudo mudou. Flashs me atingem como agulhas luminosas nos recantos da mente. Fazia tempo que eu não tinha dessas dores de cabeça. Como se o inferno todo resolvesse arder no meu crânio.
06 de Maio de 2010. Pessoas caindo. Uma peste bíblica fazendo todo mundo no planeta perder alguém. Os jornais falavam em tempestade solar. As bocas pequenas falavam em lúpulo e cevada contaminados. No momento não importou muito, pois a chamada Gripe de 2010 chegou por terra, ar e mar e abateu como gado quase 2/3 da população mundial.
12 de Junho de 2010. Entra em vigor a Lei Allan Winston. Embora o restante da população fosse imune ao vírus pelo ar, as autoridades adotaram medidas absurdas para conter a ameaça. Execuções. Cerceamentos. Execuções de novo. Quarentenas. Execuções mais uma vez. Nem preciso dizer o quanto as coisas ficaram complicadas depois disso. Se o Governo Americano já não era exatamente querido, desta vez era odiado. Estragou o Dia dos Namorados de todo mundo.
23 de Setembro de 2010. Instituída a Lei Seca para Cervejas e Outros Fermentados. Precisavam de um bode expiatório, e como tempestades solares ainda não podem ser contidas, se contentaram em penalizar qualquer coisa que contivesse lúpulo e cevada. Acho que teve gente que chorou por sete dias e sete noites. Eu fui um.
02 de Novembro de 2010. Data do primeiro atentado à bomba no Centro de Resistência de Frankfurt. Toda esta pressão acabou por despertar a insanidade dos sobreviventes, que transformaram suas fantasias e perversões em realidade. Uma série de atentados no mundo todo teve início. Virou baderna. Roubos. Saques. Assassinatos. Tudo em massa. Com tanta coisa para consertar e corpos para enterrar, os mantenedores da lei acabaram por tentar impedir os elefantes e deixar as formigas passarem. Constituições foram reescritas. Leis especiais foram criadas. Não havia contingente para impedir pequenos roubos ou agressões. Se concentravam nos crimes exponenciais. Genocídios, destruição em larga escala ou qualquer coisa que pudesse dar margem para isso. Admito que essa vista grossa já me salvou de algumas enrascadas. Digamos que nunca fui um elemento fácil. Acho que ninguém mais foi, depois de 2010.
É. Aquele foi realmente um ano de merda.
Quando minha dor de cabeça me dá um desconto e meus lábios páram de tremer, pergunto se há um Juiz de Rua entre eles. Um piá que não deve ter mais de vinte anos se manifesta. Dei sorte de pegar um novato. Sempre colocam os recém formados nos piores locais de trabalho. Neste caso, o meteram numa equipe de ronda permanente no Rio Guaíba. Não consigo pensar em nada mais deprimente que isso para um Juiz. Ele se aproxima devagar e me pergunta o que quero. Pelo menos tem colhões. Eu não quero nada. Seguro o Basi pelo colarinho molhado e faço os biscoitos voarem com três tapas no rosto do infeliz.
- O Basi aqui tem uma confissão a fazer.
O Juiz mal ouve a palavra “confissão” e já coloca o detector de mentiras no Basi. Ao contrário de sua fama de “língua frouxa”, o Basi silencia. Quebro o braço dele e tudo se ilumina. Ele fala tudo que pode. Põe em pratos limpos. Explica que deu o testemunho para a PN para se livrar de uma dívida de jogo que tinha comigo. Que forjou os fardos de cerveja com latas falsas. E que não fazia a menor idéia de que tráfico de fermentados dava execução. O display do detector dá sinal verde para tudo.
- Era só uma sacanagem. – Diz o Basi, segurando o braço mole.
Arranco os dentes do Basi num murro e ajeito meu casaco encharcado. Por causa desse imbecil, quase viro comida de cachorro. Algemam o Basi e me pedem desculpas pelo comportamento. Não vou guardar rancor por quase terem borrado as calças achando que eu era um terrorista. Só lamento não ter uma câmera pra filmar isso e ganhar uma fortuna no YouTube.
O hovercraft me deixa no cais. O Basi ficou com eles para “dar explicações do seu ato imponderado”. Que fanfarrão esse Juiz. Quase sinto pena do pobre Basi. Acho que vai pegar uns anos de cana ou duas sessões de videotortura. Mas podia ser pior.
Ele podia estar com uma bomba no pescoço...
Um comentário:
Youtube, cerveja...só faltou falar dos cinemas da época. Porque o resto eu imagino que, pela sua visao, é bem sombrio...
E tu é um cara durao do cacete, né? Que orgulho!
Beijos!
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